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Recuperação Energética de Resíduos Sólidos Urbanos

As discussões atuais sobre a recuperação energética de resíduos urbanos estão fora de foco. É errado comparar suas vantagens e desvantagens com a reciclagem, pois esta é prioritária e não é com esta que concorre. A comparação correta é com a disposição final em aterro sanitário.

A recuperação energética de resíduos é uma questão controvertida, e por isso mesmo foi tratada cuidadosamente pela PNRS. Seguindo o conceito de que legislação ambiental deve ser neutra em relação a tecnologias, pois do contrário inibe aperfeiçoamentos e inovações, o Congresso adotou a lógica de que lei a não deve restringir processos, e sim estabelecer critérios e padrões de qualidade ambiental dos processos, que podem ser sucessivamente mais restritivos nos estados e municípios. Na recuperação energética de resíduos, isso compreende basicamente limites de emissão, requisitos de eficiência energética e critérios de localização.

Acertadamente, o Brasil fixou em lei a ordem de prioridade para destinação de resíduos, priorizando a reutilização e reciclagem e deixando por último a disposição em aterro sanitário. Para assegurá-la, a lei também instituiu diversos instrumentos, como os planos de gestão, os incentivos econômicos e o licenciamento ambiental. Mas antes disso, desde 2002, a incineração de resíduos urbanos já estava condicionada à implementação de um plano municipal com metas progressivas de segregação de resíduos para reciclagem, que devem atingir 30% em dez anos, por força da resolução Conama 316, artigo 24.

A recuperação energética está incluída entre as alternativas de destinação ambientalmente adequada, que são aquelas “admitidas pelos órgãos competentes do Sisnama, do SNVS e do Suasa, observando normas operacionais específicas de modo a evitar danos ou riscos à saúde pública e à segurança e a minimizar os impactos ambientais adversos”.

A lei também estabeleceu que “poderão ser utilizadas tecnologias visando à recuperação energética dos resíduos sólidos urbanos, desde que tenha sido comprovada sua viabilidade técnica e ambiental, e com a implantação de programa de monitoramento de emissão de gases tóxicos aprovado pelo órgão ambiental”. Complementando, o decreto determinou que esta “deverá ser disciplinada, de forma específica, em ato conjunto dos Ministérios do Meio Ambiente, de Minas e Energia e das Cidades”.

Essa regulamentação está em discussão no Grupo de Trabalho 2 do Comitê Interministerial da PNRS, e deve ser finalizada até maio de 2012. Como membro desse GT, a Abetre defende as seguintes posições:

A possibilidade de recuperação energética de RSU não é conflitante com o objetivo de aumentar significativamente a reutilização e a reciclagem. São alternativas complementares para reduzir a quantidade de rejeitos disposta em aterros sanitários.

A recuperação energética de resíduos deve ser entendida como uma atividade de destinação, e não como uma atividade de geração de energia. Devem prevalecer os objetivos de proteção ambiental. A energia obtida deve ser entendida como similar a um produto de reciclagem, que poupa outras fontes e contribui para a economicidade da destinação.

A decisão quanto às alternativas tecnológicas para a destinação de RSU é de competência dos municípios, isoladamente ou em consórcio, e a participação da sociedade local está estabelecida na lei. Deve ser mantida a prerrogativa de decisão da instância local, em função de sua realidade ambiental, econômica e social.

Cabem aperfeiçoamentos em regulamentos antigos, especialmente na resolução Conama 316/2002, e na norma ABNT NBR 11.175:1990.

A Abetre também apresentou as seguintes sugestões de encaminhamento dos trabalhos do GT 2:

A regulamentação não deve dar margem a insegurança jurídica, principalmente porque o tema é controvertido. Não deve utilizar o que os juristas chamam de “conceitos jurídicos indeterminados”, isto é, “noções vagas que deixam à administração a possibilidade de apreciação segundo critérios de oportunidade e conveniência administrativa”. Isso dará margem a que autoridades públicas e juízes adotem interpretações subjetivas distintas, levando à falta de isonomia entre estados e municípios. E dessas interpretações subjetivas dependerão atos como conceder ou não uma licença ambiental e julgar legal ou ilegal uma atividade.

Definir de modo claro e objetivo como deve ser aplicada a condicionante estabelecida no § 1º do art. 9º da PNRS: “poderão ser utilizadas tecnologias visando à recuperação energética dos resíduos sólidos urbanos, desde que tenha sido comprovada sua viabilidade técnica e ambiental e …”.

Definir com clareza a abrangência ou não da regulamentação quanto aos diversos processos de recuperação energética: incineração, coprocessamento em fornos de cimento, produção de combustível derivado de resíduos (CDR), gaseificação, plasma térmico, aproveitamento de biogás de aterros sanitários, etc.

Definir com clareza a abrangência ou não da regulamentação quanto a outros resíduos além dos urbanos.

Definir termos que não foram definidos na PNRS, mas são utilizados em outras leis e regulamentos: aproveitamento, recuperação, valorização e outros.

Por: Diógenes Del Bel – Diretor Presidente

Publicado em: Revista Química e Derivados – março/2012

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